Anacoluto: caffeine for the mind, pizza for the body, sushi for the soul.

"We're not, as some people maintain, obsessed with pop culture so much as we're obsessed with its possibilities for stratification and dateability." (Thurston Moore)

1.9.04

Não, não tenho escrito muito, mesmo em face às pressõezinhas dos regulars do Anacoluto. Estou no meio de um daqueles declives escorregadios intelectuais que algumas pessoas conhecem, em que a sua mente borbulha com idéias basicamente amorfas, feitas de pequenos átomos lógicos que se chocam, se destróem, se fundem, se ligam, vão organizando mapas. Eu suponho que isto me aconteceu quando aprendi alguns truques de representação "topológica" de relações estruturadas entre conceitos que permitem configurações inteiramente novas ao meu velho modelo premissas-paradigmas-algoritmos-funções. Estive estudando grafos, topologia de circuitos digitais (de quantas formas você consegue representar um XOR em quatro camadas ou menos de ANDs, ORs e NOTs?) e de redes neurais.

Já vi este cenário antes. Muitas das coisas que descobri no tempo em que pesquisava relações gerais entre sistemas de regras (i.e. paradigmas) - digamos, para usar um exemplo matemático, a transformação de uma função em outra - permanecem no limbo do meu cérebro, incomunicáveis. A desculpa oficial é que o tempo de maturação dessas coisinhas (que não se medem em anos, mas em pulsos do errático ritmo do pensamento) cria algo como uma "tradição de pesquisa" que me é completamente interna, e é tão estranha para uma pessoa aleatória qualquer quanto o temo "modelo por cointegração" para um ator de filmes pornôs. E em todo caso, ainda consigo lançar mão de uma imagem compreensivel como o de uma transformação em um espaço de funções porque conheço alguma matemática que serve de exemplo "concreto" para o tipo de coisa em que penso para sistemas mais generalizados de pensamento.

Preciso, com alguma urgência, aprender a drill do exercício organizado do pensamento. Faltam-me exemplos "concretos" para esta forma mais geral (e o modelo premissas-paradigmas-algoritmos-funções cabe aqui como caso especial) de ligar conceitos posto que não tenho conhecimento "real" de coisas como teoria dos grafos "de verdade", topologia de redes, mapas auto-organizáveis. Por um lado, tenho o impulso a procurar esses tópicos - posto que fornecem exemplos concretos e muito bem-sucedidos do que estou pensando, mas por outro, talvez devesse dar um halt a toda essa atividade desorganizada e possivelmente improdutiva (se eu nunca conseguir escrever em equações como o sistema de conclusões racionais de, digamos, a economia austríaca, mina as bases intelectuais de todo o aparelho construtor das próprias conclusões racionais e implode, não terá servido de nada estar montando o modelo geral em que esse tipo de processo acontece).

Talvez a famigerada teoria das categorias me fizesse pensar de forma organizada em coisas muito abstratas e muito gerais. Mas o problema é, se estímulos externos (como o café fervente caindo nos meus pés descalços, ou uma menina de roxo propondo uma trégua) não conseguem impor uma pausa de alguns minutos a essa coisa que me consome toda a minha energia, como conseguiria um sistema árido, difícil de absorver, que não promete nem aplicações nem generalidade?

Ah, Mingus, dá um empurrãozinho a este pobre vulcãozinho-de-cerâmica abstrato.

12.8.04

Sinto-me estranhamente bem para um início de período. As férias de inverno costumam ser calmas, dedicadas a uma ou duas idéias de interesse; as férias de verão são passadas no IMPA. Em ambos casos, o contraste com a fábrica de salsichas me agride.

Pode ser o meu estado retraído. Tenho tentado manter diálogo com as pessoas importantes, mas ando muito mais introspectivo que o habitual, e mesmo as pequenas conversas têm me custado energia. Eu entro e saio de salas cheias sem ver nenhum rosto em específico; ando em silêncio ao lado das pessoas de sempre, e fico me perguntando o que elas têm pensado disso. Durante alguns instantes. Processamento paralelo, a minha ontologia marxista, John Updike e coisas ainda mais amorfas flutuam pela minha mente.

Outro dia, saímos para dar uma volta pela cidade de carro. Algo do tipo "que subversivo, estamos fazendo algo espontâneo". Foi uma experiência interessante. Eu não conseguia dizer muita coisa - todos os meus pensamentos se transformavam imediatamente em mitologias incomunicáveis - mas tinha uma estranha sensação de conforto, como se estas pessoas fizessem realmente parte da minha história.

Enfim. Sinto-me feliz, embora não consiga juntar energia para desfazer alguns excessos do período passado. Ei, você, eu não desisti de reatar o diálogo, apenas estou completamente voltado para dentro estes dias. Surpreendentemente, estou aprendendo a lidar lindamente com ambientes adversos, mesmo que dar aulas de monitoria esteja sendo uma tortura. Mas as minhas estratégias de adaptação não me permitem tomar iniciativas ainda.

Ei, talvez o mundo seja realmente mágico.

8.8.04

"The dead, Jesus. They were multiplying, and they look up begging you to join them, promising it's all right, it is very soft down here. Pop, Mom, old man Springer, Jill, the baby called Becky for her short time, Tothero. Even John Wayne, the other day. The obituary page every day shows another stalk of a harvest endlessly rich, the faces of old teachers, customers, liocal celebrities like himself flashing for a moment then going down. For the first time since childhood, Rabbit is happy, simply, to be alive. He tells Charlie, "I figure the oil's going to run out about the same time I do, the year two thousand. Seems funny to say it, but I'm glad I lived when I did. These kids coming up, they'll be living on table scraps. We had the meal."-- John Updike, "Rabbit is rich".

27.7.04

Semente de idéia

Marx é fundamental na história do pensamento econômico porque leva a teoria do valor intrínseco (derivado do trabalho) aceita por gente boa como Adam Smith e David Ricardo até suas últimas conseqüências, e demonstra, através do conceito de mais-valia, que o capitalismo é intrinsecamente injusto, e provavelmente inviável.

O ponto fundamental da discordância entre pessoas como eu, o Claudiux e o García e marxistas (mesmo que sejam por gut instinct ou educação - o que acontece a muita gente boa, como a Aninha Rebel) é precisamente a teoria do valor intrínseco. A partir dos marginalistas (na verdade, dos utilitaristas, mas estamos pensando em economia), o valor passa a derivar da utilidade, e demonstra-se que em determinadas condições, o valor de mercado reflete o valor-utilidade. É nessa identidade que uma doutrina liberal/libertarian racional se apóia.

A parte burra da esquerda optou por ideologizar-se, mas algumas pessoas espertas (vide Debord) centraram-se em criticar as premissas das quais se deriva a identidade valor de mercado-valor utilidade. Ainda voltarei muito a Debord, que desconstrói de maneira muito inteligente a racionalidade instrumental necessária à Identidade Liberal (termo que acabo de inventar :-)) montando uma teoria da alienação muito mais inteligente que a sustentada pelos marxistas militantes de hoje. Tal teoria da alienação explicaria o fenômeno Apple: engenharia ruim, marketing excelente, valor de mercado alto.

O problema é que para a grande maioria dos mercados vitais à infra-estrutura material sobre a qual nossa forma de viver se apóia, as premissas do equilíbrio geral valem - retornos decrescentes de escala, racionalidade instrumental, informação simétrica, etc. Não há, nessas bases, justificativa racional para postular uma inviabilidade do capitalismo, ou mesmo a desejabilidade (ergh) de uma revolução anti-mercados. Isto é, empiricamente, ao admitir o valor-utilidade, o marxismo se sabota, posto que a força de sua estrutura depende
fundamentalmente do valor intrínseco.

Desta forma, a única forma de salvar a esquerda e o marxismo - ao menos do ponto de vista da razão, do projeto socrático, da causa helênica - é centrar esforços no valor intrínseco, ou seja, construir uma ontologia materialista, uma framework dentro da qual se derivaria e demonstraria o valor das coisas. Isso forçaria todo o corpo da economia pós-marginalista que se apóia no valor-utilidade a aguçar a defesa desse princípio fundamental para além das objeções epistemológicas à possibilidade pragmática de um planejamento econômico (que em si implica em uma ontologia implícita, ou ao menos uma hierarquia dos valores).

Claro, é preciso que esta ontologia fuja das armadilhas típicas encontradas pelas teorias de organização industrial das economias planificadas. É preciso que seja dinâmica, endogeneizando a mudança constante de motivações por trás do que os homens entendem como realização para suas vidas. É preciso também que seja auto-sustentável por um sistema de regras estável, razão pela qual a teoria dos jogos precisa estar presente nela o tempo inteiro. Não podemos, simplesmente, confiar na ação positiva de uma burocracia.


Ei, você, leitor aleatório do Anacoluto. Se você resolver levar esta idéia à frente, eu quero crédito. Aliás, faça-me participar do seu projeto. Eu estou disposto a trabalhar com um marxista, mas não com essas massas educadas numa vulgata anti-mercados de vagas considerações humanistas. Se você entende do que eu estou falando, já é um bom começo. Eu tenho Orkut, procure-me.

26.7.04

Mais arte na eBay.

21.7.04

Exhale

O remix de "Breathe" é a melhor coisa de todo o Aphex Twin. Isola a agressão futurista das armadilhas da postura transgênero que veio caracterizar o Prodigy. Sobra justamente aquilo que torna "Breathe" do Prodigy paralelo a "Breathe" do Pink Floyd: o som surdo do choque entre a realidade feita de madeira àspera e as partes macias da Idéia.

20.7.04


Suppose for a moment that the automobile industry had developed at the same rate as computers and over the same period: how much cheaper and more efficient would the current models be? If you have not already heard the analogy, the answer is shattering. Today you would be able to buy a Rolls-Royce for $2.75, it would do three million miles to the gallon, and it would deliver enough power to drive the Queen Elizabeth II. And if you were interested in miniaturization, you could place half a dozen of them on a pinhead.
Christopher Evans


E é por isso, amiguinhos, que nenhum tema de economia é tão interessante quanto o problema do software.

8.7.04


Um recorte feminista vai encontrar um reacionarismo objetificante no novo single da Merrill "Peaches" Nisker (o alter-ego vulcão-sexual da líder dos angulares Fancypants Hoodlum) com o Iggy Pop. De fato, apesar da tônica agressiva de desafio, a narrativa tem Merrill se oferecendo ao macho alfa, um jogo de desafio e submissão que remete ao imaginário sexual de uma outra geração.

Eu tenho duas perguntas. Primeiro, o fato de que o Iggy responde à série de homenagens (na forma de referências a sua obra) de Merrill com algumas referências ao primeiro disco dela como Peaches significa que ele a reconhece como artista relevante no mesmo gênero em que ele fez "Raw Power" e "The Idiot" e/ou reação à chatura entenda-meus-hormônios de Lil' Kim e quejandos?

Segundo, posto que a rejeição à politização de sua sexualidade via feminismo é parte importante do discurso de Merrill, é válido dizer que ela está sendo política ao se recusar a ser política? Em outras palavras, uma mulher pode assumir uma estética sexual do tipo desafio-e-submissão apesar do feminismo, mas não contra o feminismo?

7.7.04

E enquanto o Cacá Diegues e o Tony Ramos pedem "proteção para a cultura brasileira", há um artista à solta na eBay. Esta peça é mais conceitual, e esta mais baudelaireana.

29.6.04

Lições do semestre
Ou, coisas que eu já sabia, mas deixei de lado mais uma vez


  1. Eu preciso de tempo para sonhar acordado, tempo para programar, tempo para treinar escalas, tempo para refletir sobre música, tempo para escrever, tempo para pensar em matemática, em política, enfim, tempo para todas as atividades de conceitualização abstratas que me tornam uma pessoa real.
  2. O meu ethos quixotesco não é mais cancelável, e ao abdicar dessas coisas, só me sinto mal e me torno incapaz de responder às cobranças e pressões.
  3. Algumas pessoas não demonstram suas reais emoções, mas esperam que os outros reajam em função delas.
  4. Onde um dos jogadores adota a estratégia do gatilho, o equilíbrio do dilema do prisioneiro é estável, mesmo que não seja pareto-ótimo.
  5. Preciso investir mais na coisa numérica. Tenho uma tendência natural à conceitualização em nível cada vez mais abstrato, e sem freios não paro antes da teoria das categorias, ou pior, da própria ontologia. Tenho uma crush pela coisa numérica que se reacendeu no curso de Computacional do IMPA, e devo investir a minha tendência à conceitualização nesse sentido. Simulação, redes neurais, lógica fuzzy - são esses os campos que devo perseguir.
  6. Sete disciplinas é muita coisa. Isso não quer dizer que eu não vá voltar a fazer sete disciplinas agora (com duas eletivas pesadas, cálculo III e Inteligência Computacional), mas que eu não posso levar isso no ritmo que levo um período de cinco disciplinas como foi 2003.2 - não posso ficar duas semanas sem olhar para as matérias.
  7. CR Imperator Mundi
  8. Não existe incompatibilidade real entre ser o doce de pessoa que eu sou, e deixar que as outras pessoas percebam isso. Tenho um resto platônico muito forte que repele as aparências. Às vezes algumas pessoas, mesmo que gostem de você e saibam que você não as quer mal, precisam dessas aparências.
  9. O acaso não vai me proteger quando eu andar distraído

18.6.04



Não andei escrevendo muito ultimamente, e pior, vem aí uma temporada de provas para as quais nem comecei a estudar. Isso deve me colocar fora de operação por pelo menos duas semanas. Aos habitués, peço paciência - pode ser bom escrever seu email na caixinha ao lado para ser avisado de novidades. Aos novos, é característica deste blogue que os posts antigos valem muito mais (relativamente aos novos, bien sûr) do que os posts antigos de um blogue oh-odeio-meus-pais-vou-sair-de-casa.E, Cíntia, eu ligo pra você neste fim de semana, eu prometo.

12.6.04

Idéia insone

E se o conceito de responsabilidade individual for uma mera abstração jurídica?

10.6.04

As pessoas que quiserem falar comigo terão que usar o ICQ 3189502.

O esquema do guestbook estava tornando muito difícil manter a minha vida pessoal separada do Anacoluto. E, Santo Mingus, tudo o que eu precisava era de um pouco de paz.

7.6.04



White on white
translucent black capes
back on the rack.
Bela Lugosi's dead.
The bats have left the bell tower,
the victims have been bled,
red velvet lines the black box.

Bela Lugosi's dead.
Undead Undead Undead.

The virginal brides
file past his tomb,
strewn with time's dead flowers,
bereft in deathly bloom,
alone in a darkened room
the count.

Bela Lugosi's dead.
Undead Undead Undead.

Oh Bela, Bela's undead.

6.6.04

"Opiniões fortes", ele disse

juntando-se ao esforço para solapar a idéia socrática na base de todo nosso conceito de cultura.

Enquanto isso, farto de azul, seu alvo observa melancólico um fio de cabelo escondido num livro por volta da última olimpíada.

3.6.04

Edital do Grande Concurso Cultural "Seja a Mrs. Anacoluto"

Entre comentários, posts vagos, e referências culturais kitsch, eu acho que ficou relativamente nítido que eu tenho esta coisa aparentemente incurável pela Aninha Rebel.

Sim, ela sabe disso, e sim, nós discutimos muito o assunto. E temos um consenso espontâneo de que nada será feito a respeito. Pelo lado dela, bem, ela tem necessidades radicalmente distintas e incompatíveis com as minhas. E ela mora lonjabeça, em uma espécie de Alphaville godardiana a [3ln(7)/2] horas do centro de Niterói, que já fica a [(-1/3)(e^pi*i)] horas daqui. Pelo meu lado, hã, essa história toda tem uma clout emocional espessa demais antes mesmo de começar, o que torna tudo muito cansativo, e eu não preciso de um relacionamento como um problema adicional, mas como um fator de estabilização.

Tenho um amigo que diz que eu não preciso de uma namorada, preciso de molas de suspensão novas. Ele tem razão.

A grande pergunta é, por que você, potencial candidata ao G.C.C.S.M.A responderia ao anúncio de um sujeito notóriamente pernóstico, cuja aparência você desconhece, que deve ter padrões mínimos impossíveis de atrativos físicos e intelectuais ao pré-selecionar as candidatas, que pretende usar você como mola de suspensão e ainda por cima se declara apaixonado por outra menina?

Ora, porque eu conto ótimas piadas! Mesmo pessoas que odeiam a mim e a todos os valores que me são mais caros, como a Ralissa, podem confirmar isso.

Como sempre, as candidatas interessadas podem se inscrever para o concurso na caixinha de comentários indicada com um CRÁS, aí embaixo. Para mais informações sobre o prêmio, hã, ver o resto do blogue.

Um tanto cínico para um personal ad, eu sei. "Starfuckers Inc." do Nine Inch Nails pode não dar o clima certo para um anúncio destes, que requer este equilíbrio instável entre súplica e propaganda, entre grovelling e poder. So sue me.

31.5.04

Aninha, tu és o meu máximo denominador comum.

28.5.04

Duas vocações

O economista em mim não precisa censurar o crítico cultural. Parece tolo, mas é uma grande descoberta. Eu posso acreditar no mercado como provedor de soluções sociais ótimas e ser um crítico de seus resultados no campo da cultura.

A crítica da cultura não implica em um chamado à intervenção, ou mesmo na posição freqüentemente associada de que o vazio cultural é um resultado necessário da natureza de um sistema político-barra-econômico subjacente. Eu não preciso nem mesmo montar um argumento de falha de mercado, embora haja um muito forte no alto custo de entrada no mercado cultural.

Em todo caso, as barreiras de entrada estão caindo, e em nenhuma época da História houve uma tal diversidade cultural acontecendo em uma velocidade tão alta. Claro, a menina da xerox da PUC não está necessariamente ouvindo Squarepusher, mas as evidências de que o capitalismo está, afinal, chegando, são cada vez mais fortes.

É claro que a gradual expansão destas subculturas que re-valorizam a inteligência vai enfrentar uma sociedade não preparada pra isso. É claro que no dia em que o Multishow descobrir Squarepusher, caetanos e chicos vão espernear. E, num mundo onde grupos especiais de interesse determinam soluções políticas (mesmo que não no âmbito dos governos, mas na máquina privada produtora de cultura) inferiores às que surgiriam espontâneamentee, o sucesso eventual da inteligência não é seguro.

Assim, a crítica da cultura é, sim, válida. Há mais inteligência em Alan Licht do que em Ubiratan Iorio, mesmo que este repita algumas verdades fortes pinçadas de bons livros, enquanto aquele desconfie que a correlação entre a teoria sócio-política (o capitalismo) e o fenômeno cultural (pocotós e mariaritas) implique em causação. A ingenuidade de Alan Licht é vital onde a sabedoria de Ubiratan Iorio é burra: no lugar em que a inteligência ocupa na hierarquia dos valores.

Sou uma espécie de liberal por experiência do torpor da burocracia estatal e por fatos demonstráveis a respeito de mercados estilizados, mas não coloco a política acima da inteligência. A inteligência deveria estar no topo da hierarquia dos valores, porque sem ela não definimos com clareza aquelas coisas importantes todas como "ética", "bem", "belo", "verdade", e ficamos vulneráveis às sucessivas ondas de double-speak. A distopia orwelliana é antes de tudo uma de exílio da inteligência.

É por isso que eu queria que um homem como Richard "RMS" Stallman se candidatasse à presidência americana, muito embora eu discorde fundamentalmente das suas posições-chave. Dubya Bush é um bobão, John Kerry é um family guy intranscendente, e mesmo o velho e bom Ralph Nader está ficando mais velho que bom, e não aprendeu a programar em C para acompanhar os tempos.

Precisamos reinjetar inteligência em todos esses debates; colocar o posicionamento estratégico acima da inteligência é um declive escorregadio ao longo do qual estamos deslizando, parando para pensaar apenas quando trocamos um Carter por um Reagan, um Andropov por um Chernenko, um FHC por um Lula.

Santo Mingus, que saudades que tenho de Fernando Henrique...

19.5.04

Sobre a melodia de "Money for nothing" dos Dire Straits


I want my KDE
I want my KDE

Now look them at yo-yos - that's the way you do it
you write QT apps for your KDE
that ain`t coding - that's the way you do it
software for nothing and bits for free
Lemme tell ya them guys ain't dumb
Maybe get a blister on your little finger
Maybe get a blister on your thumb

We gotta install kdelibs3
we gotta install that kdepim
we gotta write for kdevelop
we gotta pack that tar.gz

See that little faggot with the black t-shirt
yeah buddy he's really that fat
that little faggot got his own custom windec
that little faggot he's a programmer

We gotta install kdelibs3
we gotta install that kdepim
we gotta write for kdevelop
we gotta pack that tar.gz

I should have learned how to gzip and untar
I should have learned to write Python
Look at that mama, she's stickin the USB camera
man we could have some fun
and he's up there, what's that? segfault errors?
melting up his core dumps, crashing XFree
that ain't coding - that's the way you do it
get your software for nothing and bits for free

Now that ain't coding - that's the way you do it
you write QT apps for your KDE
that ain't working, that's the day you do it
software for nothing and bits for free

I want my
I want my
I want my KDE

18.5.04

Omega Amigo

Alan Greenspan foi re-nomeado para presidente do Federal Reserve Board.

É interessante que a essa altura compreendamos bem os escorregões do Fed em vários pontos da história. É interessante também que Greenspie tenha sido aclamado como maestro por gente de várias posições políticas. Nunca é demais relembrar que é Bush quem está renovando Greenspie, muito embora este seja acusado de ajudar os democratas durante a grande expansão dos 1990. Pareceria que a macroeconomia está finalmente entendendo as coisas, e que talvez Keynes estivesse certo ao sonhar que os macroeconomistas seriam encarados como "bons dentistas" algum dia.

Sim, os austríacos podem espumar. Mas, bem, o Ubiratan Iorio nunca foi aclamado como maestro. Polemistas há em cada esquina.

7.5.04

"Pinkerton" é o meu Weezer favorito.

Os outros álbuns têm muito Weezer tentando ser o Weezer.

6.5.04

Uma modesta proposta

Visto e considerando que:

  1. Os bons livros brasileiros são raros - embora não tanto quanto os bons discos brasileiros - pelas mesmas razões que são raros os bons músicos brasileiros, embora de forma muito menos severa.
  2. Mesmo sob regimes de isenção de alguns impostos, importar livros é caro, em parte por causa dos custos do frete, e em parte porque estes recebem um preço compatível com o bolso estrangeiro, geralmente melhor provido que o nosso.
  3. Traduzir é caro, os bons tradutores são menos raros que os bons músicos, mas ainda assim difíceis de encontrar, e as traduções que chegam ao mercado são de chorar de tão ruins.
  4. Andorinhas africanas sabem mais sobre diagramação e layout que os editores brasileiros.

propõe-se que
  • Editoras gráficas brasileiras reeditem livros estrangeiros, sob licença e usando as matrizes originais das edições estrangeiras, sem tradução ou rediagramação. Um novo filão editorial será descoberto, as editoras estrangeiras ganharão os habitués de fotocópias que não conseguem comprar a edição original, e a priori o mercado de traduções não deveria ser muito afetado. Estou certo de que há muitos livros sem demanda o suficiente para bancar o processo de tradução e reedição, mas que gerariam lucro numa reimpressão autorizada, saindo tudo mais barato para todos.

4.5.04

Note to self: nunca mais conduzir experimentos de otimização neuroquímica em mim mesmo durante a época de provas.

26.4.04

Frio

Faz frio às cinco e meia da tarde no IPEA. A sala de estagiários compartilha o ar-condicionado com o servidor da rede e do website, e à medida que o calor lá fora se esvai, o ambiente aqui dentro vai ficando gelado.

Às vezes tento lutar contra o frio ouvindo Django Reinhardt ou Earl Hines, mas nunca funciona realmente. Conheço gente que tenta equilibrar seu estado de humor com música no sentido oposto, mas eu nunca pude tolerar a desarmonia em que isso implica.

É um estado de espírito temporário, em grande parte estimulado pela certeza de que estou irradiando calor para além do meu controle, e me sentindo cada vez mais frio por causa disso.

Só resta "The Ascension" - o contraste entre o caos circundante e a lógica interna (o cosmo sangrento e a alma pura, como disse um outro), e a necessidade de ser frio para permanecer vivo, ou de rodear-se de frio para isolar o calor interno.

Então eu me cubro com muita roupa, e não consigo reconhecer a pessoa que (não) fez a declaração de ontem. Só um feriado prolongado, e um longo tempo fora do ar-condicionado permitiria que esta outra pessoa aflore. E predomina a quieta certeza de que emoções são coisas raras e frágeis, que devem ser escondidas, porque o mundo lá fora nunca saberá apreciá-las.

25.4.04

Sete fatos divertidos sobre o conflito árabe-israelense e uma declaração de amor


  1. Yasser Arafat foi virtualmente o líder do Setembro Negro, o grupo que dizimou a delegação israelense nas olimpíadas de Munich. Faz você pensar sobre o tipo de pessoa com que se é obrigado a negociar
  2. A lei islâmica exige que qualquer terra que já tenha sido de controle islâmico deve permanecer sobre controle islâmico. A imprensa esqueceu deste fun fact quando dos atentados na Espanha. Esta é a razão pela qual os assentamentos palestinos não foram transferidos para regiões desabitadas da Jordânia, gerando o problema social que eles são hoje. Fica a pergunta - dada a oportunidade, será que "eles" hesitariam em marchar sobre Viena?
  3. Israel é a única democracia pluripartidária de toda a região, chegando a contar com um partido árabe de presença significativa no parlamento.
  4. Mais de um milhão de judeus foram literalmente expulsos de casa em países árabes a partir de 1947. Estas pessoas não esperam mais compensação jurídica, e foram absorvidas por Israel - razão pela qual não existem campos de refugiados de judeus. Em contraste, as nações árabes essencialmente deixaram o problema palestino explodir até a presente condição de miséria, miserabilidade e miserabilórdia que faz com que tantos jovens palestinos se juntem a brigadas de mártires por absoluta falta de perspectivas.
  5. Árabes israelenses não são obrigados a servir o exército de Israel - acabariam lutando contra o seu próprio povo. Muitos empregos públicos requerem que você tenha servido o exército, mas nada impede que um árabe tenha feito isso, se tornando legalmente indistingüível do Ariel Sharon.
  6. Imediatamente após a Guerra dos Seis Dias, em que Israel tomou do Egito a Península do Sinai, e da Síria as colinas de Golã, Israel propôs devolver essas terras em troca de um acordo de paz definitivo. O Egito e a Síria se recusaram.
  7. A última rodada de negociações de algum peso, em Camp David, 2000, terminou porque Yasser Arafat se recusou a fazer uma contra-proposta à idéia israelense de formar um Estado independente em duas faixas descontínuas de terra. A atual intifada é um resultado disso.


(Não, não há declaração de amor nenhuma - não consegui escrevê-la, e o título ficou como testemunha. É algo um pouco despropositado, anyway. Algo que deveria ter sido dito numa noite escura de uma cidade distante há três anos. Vocês sabem, in New York freedom looks like too many choices, e ainda não entendo por completo - que dirá naquela época - o sentido de algumas palavras que surgem ao pensar nesta pessoa. Enfim, os leitores habituais podem ver que o Anacoluto está voltando ao seu formato "normal", e prometo que a temporada de desabafos, resoluções e declarações de amor interrompidas está perto do fim.)

13.4.04

Pascácios! Pacóvios! Lorpas!

11.4.04


"(Howard Roark) That, precisely, is the deadliness of second-handers. They have no concern for facts, ideas, work. They're concerned only with people. They don't ask, 'Is this true?' They ask: 'Is this what others think it's true?' Not to judge, but to repeat. Not to do, but to give the impression of doing. Not creation, but show. Not ability, but friendship. Not merit, but pull. What would happen without those who do, think, work, produce? Those are the egotists. You don't think through another's brain and you don't work through another's hands. When you suspend your faculty of independent judgement, you suspend consciousness. To stop consciousness is to stop life. Second-handers have no sense of reality. Their reality is not within them, but somewhere in the space that divides one human body from another. Not an entity, but a relation - anchored to nothing. That's the emptiness I couldn't understand in people. That's what stopped whenever I faced a comittee. Men without an ego. Opinion without a rational process. Motion without brakes or motor. Power without responsibility. The second-hander acts, but the source of his actions is scattered in every other living person. It's everywhere and nowhere and you can't reason with him. He's not open to reason. You can't speak to him - he can't hear. You're tried by an empty bench. A blind mass running amuck, to crush you without sense or purpose. Steve Mallory couldn't define the monster, but he knew. That's the drooling beast he fears. The second-hander.

(Gail Wynand) I think your second-handers undestand this, try as they might not admit it to themselves. Note how they'll accept anything except a man who stands alone. They recognize him at once. By instinct. There's a special, insidious kind of hatred for him. They forgive criminals. They admire dictators. Crime and violence are a tie. A form of mutual dependence. They need ties. They've got to force their miserable little personalities on every single person they meet. The independent man kills them - because they don't exist within him and that's the only form of existence they know. Notice the malignant kind of resentment against any idea that propounds independence. Notice the malice towards an independent man. Look back at your own life, Howard, and at the people you've met. They know. They're afraid. You're a reproach.

(Howard Roark) That's because some sense of dignity always remains in them. They're still human beings. But they've been taught to seek themselves in others. Yet no man can achieve the kind of absolute humility that would need no self-esteem in any form. He wouldn't survie. So after centuries of being pounded with the doctrine that altruism is the ultimate ideal, men have accepted it in the only way it can be accepted. By seeking self-esteem through others. By living second-hand. And it has opened the way for every kind of horror. It has become the dreadful form of selfishness which a truly selfish man couldn't have conceived. And now, to cure a world perishing from selflesness, we're asked to destroy the self. Listen to what is being preached today. Look at everyone around us. You've wondered why they suffer, why they seek happiness and never find it. If any man stopped and asked himself whether he's ever held a truly personal desire, he'd find the answer. He'd see that all his wishes, his efforts, his dreams, his ambitions are motivated by other men. He's not really struggling even for material wealth, but for the second-hander's delusion - prestige. A stamp of approval, not his own. He can find no joy in the struggle and no joy when he has succeeded. He can't say about a single thing: 'This is what I wanted because I wanted, not because it made my neighbors gape at me.' Then he wonders why he's unhappy. Every form of happiness is private. Our greatest moments are personal, self-motivated, not to be touched. The things that are sacred or precious to us are the things we withdraw from promiscuous sharing. But now we are taught to throw everything wiithin us into public light and common pawing. To seek joy in meeting halls. We haven't even got a word for the quality I mean - for the self-sufficiency of man's spirit. It's difficult to call it selfishness or egotism, the words have been perverted, they've come to mean Peter Keating. Gail, I think the only cardinal evil on earth is that of placing your prime concern with other men. I've always demanded a certain quality in the people I liked. I always recognized it at once - and it's the only quality I respect in men. I chose my friends by that. Now I know what it is. A self-sufficient ego. Nothing else matters."

(Ayn Rand, "The Fountainhead")

10.4.04

Chafariz

Da primeira vez que li The Fountainhead, não consegui prestar atenção em nada além da oposição fundamental entre o tipo Howard Roark e o tipo Peter Keating. As pessoas em geral têm idéias morais muito difusas, e embora eu pense um pouco mais em casos-limite do que as pessoas ao meu redor, não tenho ainda uma teoria mais geral do que é certo.

Os efeitos da identificação são difíceis de separar: até que ponto eu encontrei em Howard Roark um reflexo da minha própria filosofia de vida, e até que ponto o seu heroísmo fulgurante influenciou a forma como enquadro esses problemas de moral?

O que é nítido que apenas depois dessa leitura, passei a procurar Peter Keating, Dominique Francon e Ellsworth Toohey nas pessoas que demonstravam alguma força. A moral é uma expressão do pessimismo, e embora fosse uma taxonomia útil, não era conceitualmente diferente de procurar Oliver e Laurel Hardy. Em vários pontos, julguei erradamente pessoas como peterkeatings, e só passei a entender o impulso pragmático, insensível de algumas pessoas depois de tomar contato com um sistema taxonômico mais sofisticado - o MBTI.

Claro, por sua vez, o MBTI me trouxe a idéia de que o conjunto de motivações gerais que estão por trás das opções das pessoas passa paralelamente ao plano da moral. A linguagem clínica da psicologia funcional tem dessas coisas: naturaliza a ação humana como se esta não fosse por definição ação, sujeita a julgamento.

O MBTI me fez aceitar alguns peterkeatings na minha vida. E pode ser um pouco doloroso romper com hábitos intelectuais tão otimistas e simplificadores quando o amoralismo psicológico. E claro, as pessoas deixam marcas. Não tenho o foco irresistível de um Howard Roark (um personagem idealizado, claro), e pessoas vão se tornando importantes por razões inteiramente irracionais.

Decisões envolvem dor. Eu vou passar a vida inteira me acostumando à idéia.

Enfim. Estou lendo The Fountainhead de novo, e passando ao largo da filosofia moral. O que mais tem me impactado é a densidade da civilização e como ela se expressa na arquitetura. De fato, meus sentidos têm se aberto, embora ainda não tenha propriamente uma educação arquitetônica, e tenho começado a fazer pequenas tentativas de juízo.

Às vezes, a forma como penso em arquitetura me lembra a forma como algumas pessoas mais simples pensam em música - não como um sistema complexo de significados que começam nas opções teóricas mais profundas, passam pela construção formal e desembocam no sistema de gêneros e referências em que uma determinada obra se situa, mas simplesmente como um barulhinho organizado que agrada ou desagrada.

Tenho tomado caminhos muito mais longos que o necessário na saída do IPEA, para passar pelos meus prédios favoritos no Centro. Ainda não entendo o suficiente para esboçar um comentário, e talvez me impacte mais o clima, o mood de todo um ambiente formado por várias construções de contextos arquitetônicos completamente diferentes, do que a inteligência de um prédio específico.

E como todo garoto que descobre as dissonâncias e o heavy-metal, me atraem estruturas que quebram a coerência de uma landscape, estruturas que não deveriam estar lá num mundo perfeitamente coerente.

O Ministério da Fazenda é um pedaço de história nazista no meio de uma paisagem ensolarada que parece contradizê-la, a abundância de relógios em caracteres germânicos é testemunha de um projeto de desenvolvimento que esqueceu das pessoas para quem era pensado, e os imensos cinzeiros em forma de piras funerárias são um comentário irônico sobre a própria natureza da política.

O chafariz gigantesco na Cinelândia é uma colagem desproporcional, um relógio derretendo - uma combinação de classicismo e absurdo que foi feita com maior e menor bom senso nas artes plásticas, mas que me agrada por injetar um pouco de caos no cotidiano apressado destas pessoas todas que vivem sem sentido.

Eu poderia estar mais feliz. Mas a felicidade é por vezes contraproducente, e talvez seja verdade que nada importante acontece sem um batismo de fogo e gelo. No médio prazo, preciso aprender a lidar com as minhas emoções, mas por enquanto, aprender a ouvir a arquitetura já torna a vida uma experiência muito mais carregada de sutilezas e meios-tons.

31.3.04

Sabe quando, na noite de ano novo, os fogos de artifício precipitam a chuva?

Aparentemente, o fato de eu não ter recebido um email precipitou uma turn of events que, embora inevitável, não tinha data pra acontecer.

Enfim. Se eu tivesse tentado fazer isso pessoalmente, acabaria reagindo emocionalmente e me desculpando por coisas que eu não fiz. De algum forma, eu precisava ser frio. E embora a Ralissa possa estar algo emputecida agora, ninguém saiu ferido, não há conflito e/ou partido a ser tomado, e talvez o Glenn Branca venha a vender alguns discos a mais.

Um outro questionamento possível é a necessidade de tornar isso público. E, sim, a coisa acabou indo mais para o lado pessoal do que eu queria - eu tinha planejado falar sobre mudanças, e este caso era apenas uma parte da mudança - mas eu tinha sono, algumas emoções negativas, e nenhuma vontade de tornar isto menos difícil.

Enfim. Eu devo desculpas aos leitores regulares do Anacoluto, que estão aqui para me ler falando mal do Lula e da MPB, e ao Cláudio, que estava mais ligado à Ralissa do que eu tinha pensado.

Ah, e Jugovic - vá à merda, meu filho.

28.3.04

Uma carta aberta de despedida

Ralissa, não sei que merda houve com você. Mas eu sabia que isso tinha que acontecer alguma hora, e talvez seja bom que tenha acontecido agora. Talvez seja o símbolo de algumas mudanças que têm que acontecer agora, e que circulam em torno do fim do meu tempo livre, agora que estou muitocupado no trabalhestágio.

No fundo, sempre tivemos projetos de vida completamente incompatíveis, visto que não estou disposto a vender a minha alma por dois pontos na prova do Tinoco, e não sei por que quis contar você na lista de pessoas que foram importantes em alguma época. Uma das coisas mais assustadoras para um INTP é ser confrontado com a evidência de que agiu de forma irracional, mas fica o consolo de que isso nunca foi, na verdade, uma traição de princípios.

Mas você marca uma época, e na verdade acho que é dessa época que estou me despedindo. Você não é o símbolo mais adequado para essa época, mas é uma coincidência cronológica feliz. Eu acabo de ler o seu post no Tostando M., e na verdade, sinto-me feliz de ter tido um sonho, e ter ido além do razoável por ele.

O mundo não é mágico, as coisas não caem no lugar sozinhas, mas ainda podem ser perseguidos trade-offs perfeitamente razoáveis, que não representam uma traição de princípios. Em um universo quase aleatório, ainda existem certas combinações, e a natureza para ser comandada, deve ser obedecida.

Enfim. Eu espero que você tenha uma ótima vida, que cace muitas perdizes e que ouça mais Glenn Branca e menos Simon & Garfunkel. Você não quer ter uma crise existencial de proporções amazônicas aos 35 anos, e por isso é bom que você equilibre um pouco esse seu pragmatismo como estrutura com um pouco de celebração do caos em estado puro.

Ah, não é tão triste quanto parece. People don't live or die, people just flow.

22.3.04

Les mots

Frase da Casa Branca sobre o assassinato do líder do Hamas:

We are deeply troubled by Israel's assassination of Hamas leader Sheikh Ahmed Yassin

Interpretação do Jornal Nacional:

A Casa Branca não condenou o assassinato, e grupos palestinos dizem que a vingança deve ser contra os americanos, não contra Israel

Hmmm.

19.3.04

Boas notícias para o presidente Lula

O desemprego caiu.

Diego Navarro saiu das estatísticas do desemprego, e vai trabalhestagiar no IPEA.

16.3.04

Mais formas como Dubya Bush pode acabar com o grande capitalismo americano

É realmente triste quando o americano comum começa a se preocupar se o governo chinês vai impedir a Microsoft de integrar a BIOS ao Windows, impedindo - ou dificultando muito seriamente - a instalação de qualquer outro sistema operacional.

Informação mais densa pode ser lida aqui.

Sim, há apenas alguns anos, na era Clinton, estávamos discutindo seriamente se o predomínio da Microsoft era daninho à concorrência, mesmo em algo de relativa pouca importância como o mercado de browsers web.

Tem horas que eu acho que é Dubya Bush que está metido na grande conspiração comuno-totalitária.

15.3.04

Econometria de orelhada

Qual destas regressões aproxima melhor os dados?




14.3.04

O Incrível Caso de Dmitry Sklyarov - ou, porque Dubya Bush pode ser letal para o futuro do grande capitalismo americano.

Um resumo, cortesia da EFF, uma campanha a favor do homem, uma explicação (um tanto panfletária, mas instrutiva) sobre o tal do DMCA, e a campanha da EFF sobre o assunto.

12.3.04

If

Não costumo gostar de blogues cortar-colar, mas todo dia conheço uma nova pessoa que não sabe que a verdade não vem dos outros, do pensamento dos outros e do julgamento dos outros.

Los jóvenes de hoy en dia não cresceram lendo grandes poemas morais. É pena. Sou uma pessoa frágil, e é surpreendente que eu tenha mais estrutura, mais valores e mais verdade emergindo do meu espírito que quase todo mundo que conheço.


If you can keep your head when all about you
Are losing theirs and blaming it on you;
If you can trust yourself when all men doubt you,
But make allowance for their doubting too;
If you can wait and not be tired by waiting,
Or, being lied about, don't deal in lies,
Or, being hated, don't give way to hating,
And yet don't look too good, nor talk too wise;


If you can dream - and not make dreams your master;
If you can think - and not make thoughts your aim;
If you can meet with triumph and disaster
And treat those two imposters just the same;
If you can bear to hear the truth you've spoken
Twisted by knaves to make a trap for fools,
Or watch the things you gave your life to broken,
And stoop and build 'em up with wornout tools;


If you can make one heap of all your winnings
And risk it on one turn of pitch-and-toss,
And lose, and start again at your beginnings
And never breath a word about your loss;
If you can force your heart and nerve and sinew
To serve your turn long after they are gone,
And so hold on when there is nothing in you
Except the Will which says to them: "Hold on";


If you can talk with crowds and keep your virtue,
Or walk with kings - nor lose the common touch;
If neither foes nor loving friends can hurt you;
If all men count with you, but none too much;
If you can fill the unforgiving minute
With sixty seconds' worth of distance run -
Yours is the Earth and everything that's in it,
And - which is more - you'll be a Man my son

Rudyard Kipling, "If".

8.3.04



O Steven Wright - um INTP entre os INTP's - freqüentemente conta uma história supostamente verídica de como, por volta dos oito anos, teria ido se queixar a uma professora no final da aula.

"I don't get it", dizia ele. A professora, provavelmente uma dessas moças prestativas mas essencialmente clueless em relação às nervuras do real - não muito diferente de D. Ottalice - respondeu algo do tipo "O que, precisamente, você não entende?"

"What, exactly, don't you get?". Apontando para a rua, para as pessoas, o jovem Steven Wright responde:

"Just in general. I don't get it."



Este é um mundo realmente esquisito, mesmo para pessoas inerentemente melhor adaptadas a ele, como a Ralissa. Em recente ensaio no Tostando M., ela discorre de modo meio amorfo sobre tipos de amizade.

A verdade é que eu não entendi muita coisa, e acabei deixando um comentário que em linhas gerais eu conhecia dois tipos de pessoas - aquelas de que gosto, e aquelas que são como vegetação com pernas e bocas, uma espécie ambulante da Grande Planta do filme "Little Shop of Horrors".

Eu sempre fui bastante positivo em relação a não trabalhar com categorias confusas, e usar de modo naïf as idéias dicotômicas de gostar e não gostar. E isso pode ser muito problemático, porque as relações que as pessoas estabelecem acontecem dentro de um espectro muito denso, e acaba que eu não consigo estabelecer uma diferença entre a Aninha Rebel, que me procura quando ela está deprimida, e a Ralissa, que me procura quando eu estou deprimido.

Pareceria que eu tenho muitos amigos. No total devem ser umas quinze pessoas, mas são pessoas tão ricas, e tão diferentes, que fica a sensação de que são muito mais.

Outro dia, na pressa de encontrar uma moldura teórica que fizesse sentido e me permitisse fugir de uma conversa mais emocional, defini "amizade" como uma "cooperativa de seguro existencial". E é verdade que você começa a gostar das pessoas por alguma razão específica - o Cláudio, porque ele me relembra do que posso ser, o Caio, porque ele me lembra que se der tudo errado, não será uma catástrofe digna de suicídio ritual japonês, o Yie Chen, porque me lembra de que há pessoas como eu perambulando pelo mundo, a Ralissa, porque ela me lembra que é ok ser uma pessoa realmente estranha, o Bernardo, porque ele me faz ter certeza que é possível ir até o topo tendo as melhores intenções - e inclusive a Aninha Rebel - porque, quando ela aparece, me relembra de que a minha angústia não é única, e que everybody hurts.

Conversar com essas pessoas (às vezes simplesmente estar com essas pessoas) sempre aliviou o mal-estar essencial ao morar em um mundo que não é o seu mundo, mas é um mundo construído espontânea e histericamente por e para ESFJs espontâneos e histéricos.

Claro, por pura lógica, o mero fato de saber que essas pessoas existem seria o suficente para lidar com o mal-estar. O estranho é que mesmo para além do efeito terapêutico sobre a minha inadaptação fundamental, eu continuo gostando delas. O mundo é tão mais rico com elas dentro.

2.3.04

Anima

Para entrar no clima do curso de Filosofia Medieval II (é uma looonga história...), estou ouvindo música sacra.

Ontem foi um dia de obras para órgão de Bach. Hoje, parti parti para o Stabat Mater de Giovanni Pergolese, nas vozes de Mirella Freni e Terenza Berganza, acompanhadas pela orquestra "Scarlatti" de Nápoles regida por Ettore Gracis.

Devo ficar durante algum tempo no Stabat Mater - uma obra surpreendentemente rica - mas quando conseguir sair daqui, partirei para o Réquiem de Fauré.

Contam os cronistas da vida e milagres de Diego Navarro que durante sua gestação, ele assistia aos ensaios do Réquiem de Fauré, devidamente embutido no ventre da mezzo-soprano e mamãe. Mas não creio que tenha voltado a ouvir essa peça em especifico depois de nascer.

Os anacolutenses ficarão informados das segundas impressões de Diego Navarro, aprendiz de feiticeiro y caballero del reino por la gracia de Dios.

28.2.04

Do goats.com



25.2.04

Rádios

Sou um habitué de rádios online de drum-and-bass. Devido à epidemia do MyDoom, a minha rádio favorita (que ainda não aprendeu que Windows é para desktops, não para pequenos servidores, Linux é para pequenos servidores e não para desktops), a Drum'n'Bass TV está funcionando mal, e estes dias tenho ouvido a Jungle Train.

Para os curiosos sobre o gênero, vale a pena experimentar.

22.2.04

So Awkward

É impressionante como estou escrevendo mal. Ritmos erráticos, frases confusas, idéias complicadas apresentadas de forma casual, e inclusive uma primeira pessoa do plural muito mal usada.

Preciso voltar a escrever regularmente. Enquanto isso, I apologize profusely.

21.2.04

Eles entenderam tudo errado

Metade dos críticos de rock chamam o Coldplay de "Radiohead limpo". A outra metade fala de "british sensitive rockers". Ora, onde o Radiohead é irracional (e que não fique a conotação negativa da palavra aqui), Coldplay fala constantemente de uma obsessão irredenta pelo controle.

Veja, pessoas sensíveis permitem-se explorar o acaso. Os dois trechos mais significativos vêm de "Politik" (give me one, 'cause one is best - in confusion, confidence) e "God put a smile" (give me smile and give me grace - and put a smile upon my face), e clamam justamente por um abrigo do acaso, por um mundo mais razoável onde viver seja menos perigoso.

Toda a narrativa do Coldplay fala de pessoas insensíveis (em parte porque racionais como método e destino, e em parte porque auto-centradas, vivendo a parte que importa da sua vida dentro de si mesmas) sendo confrontadas com as suas emoções, com o seu sentir (e aqui acontece uma interessante duplicidade feel/sense) o mundo. Eu acho que é isso o que me atinge com mais força.

Para quem anda acompanhando as minhas aventuras pelo sistema Myers-Briggs, são as aventuras de tipos xNTx explorando suas funções Sx e Fx. Eu acho que alguns críticos de rock ainda não sabem disto aqui: nós não somos personagens com histórias simples e reações simples a histórias de tipos comuns. Nós vivemos vidas, estas sucessões de fatos e sensações incrivelmente complexas, irredutíveis a estruturas narrativas.

Mas claro, "Clocks" fala de quando amamos estar vivos, acordar cada dia, e nos jogarmos no abismo.

17.2.04

15.2.04

Mais pingos nos iis

Não é que eu não poste por falta de idéias. Paradoxalmente, tenho padecido de um excesso de idéias para o blogue, mas estas idéias surgem nos momentos mais inapropriados, quando não posso ou não quero interromper as atividades em curso para explicar em termos verbais mais nítidos aquilo de que quero falar. Por outro lado, as idéias são tantas que não posso me dar ao luxo de digitar todas, e mesmo o processo de escolher as mais anacolúticas entre elas é cansativo e não me inspira entusiasmo.

Quando eu entrar numa fase menos imaginativa, trabalharei com calma cada conceito. On verra on verra.

12.2.04

Set off alarms

Os Narbotic são a minha banda de rock favorita do momento. Strokes meets IMPA meets White Stripes meets ansiedade matemática.

Recomendo muito ouvir "Alarm in the graduate school", disponível para download no site deles

They said, study with the best
or die like the rest
I gave her pieces of my brain
just to pass the test
Y'know I'd never thought
that I'd be learning surgery
for this MaS I'm going all the way
ring the alarm

11.2.04

9.2.04

Nós apoiamos

Get Firefox

4.2.04

Do Diesel Sweeties



Eu estou pensando seriamente em abandonar o meu clássico modus operandi de "deixar o acaso acontecer". Talvez eu deva começar a entrevistar candidatas.

Inscrições para o processo seletivo na caixa de comentários abaixo.

3.2.04

You had chemicals boy

Eu acabo de baixar o remix em dnb ("London Electricity mix") de "Born Slippy" do site oficial dos Underworld. A versão original tinha uma letra fantástica sobre um batidão bate-estaca four-on-four irritante - e este remix corrige isso.

O que posso dizer sobre "Born Slippy"? É uma mistura fascinante de canto de esperança no futuro, meditação sobre a superficialidade da consciência e narrativa perturbadora sobre estados neuroquímicos alterados.

"Born slippy" é a "Blowing in the wind" da nossa era - a cultura pop que passa do tomismo a Spinoza, do canto de liberdade e da responsabilidade ética que da liberdade advém ao questionamento mais propriamente filosófico sobre as motivações profundas por trás das ações que julgamos livres.

Em paralelo a isso, "Born Slippy" canta o devir. É uma boa época para se viver, quando estes ingleses que escrevem música para a pista de dança fazem o melhor comentário explicativo sobre Bergson que existe em lingua laica.

Convertido em dnb, que em si é o culto da velocidade pura como método de análise, as três faces do fluxo de consciência coletiva de "Born Slippy" apenas ganham camadas de significado. O sentido spinoziano da aparência contraditória de liberdade, em particular, torna-se concreto e físico: as nossas ações acontecem tão rápido que se tornam efeito antes de que consigamos querê-las.

É a inteligência coletiva chegando a uma maturidade tal que a faz redescobrir os projetos filosóficos de alguns homens particularmente lúcidos que se destacaram para o seu tempo. Paul Virilio ficaria orgulhoso.

2.2.04

Dear Prudence

Aninha Rebel, minha anti-semitinha favorita, mande-me uma mensagem pelo ICQ. Deletei você por erro, e não consigo mais achar o UIN.

Eu culpo o Santeiro

A data do leilão do prédio onde está instalado o IMPA está marcada para o dia 12 de fevereiro. Talvez a única instituição de pesquisa séria deste país, o IMPA acabou no lado mais fraco da corda de uma disputa judicial entre alguns pesquisadores do CNPq e o governo. Condenado pela justiça a acertar suas contas, o CNPq vai vender o prédio.

A nota de Elio Gáspari que nos relata isso conclui culpando, doce e irônicamente, a meta de superávit primário pelo estado lamentável a que a situação chegou. Talvez sem o querer, Elio Gaspari se torna porta-voz da mais tola das heterodoxias, aquela cujo corpo teórico se compõe de pequenas observações sarcásticas sobre casos anedóticos.

Sim, o superávit primário leva a uma corrida de cortes, e a informação assimétrica cuida do resto: do ponto de vista do homem que tem que equilibrar as contas, um instituto de pesquisa em matemática e uma produtora de vídeos acochambrada dentro de uma universidade federal são a mesma coisa.

Mas o ajuste fiscal é uma necessidade imperiosa, e a circunstância de ter que fazer estes superávits dolorosos é resultado de décadas da mais pura fuzarca. É errado culpar o superávit primário pelo cenário kafkiano de vender o IMPA.

Eu culpo Sérgio Santeiro, o imortal rei-montanha do IACS/UFF.

30.1.04

Gauss-Seidel



% Parametros: A, b, X inicial, convergencia, tolerancia
function x = gauss_seidel(A, b, xi, conv, tol)
tic
ox = xi;
tx = ones(1,length(xi));
k=0;
while max(abs(A*tx' - b)) > tol
sprintf('Iteracao %d... variacao = %0.5g',k, abs(max(ox - tx) / max(tx)))
sprintf('Maoir erro = %15.5f', max(abs(A*tx' - b)))
ox=tx;
for i=1:length(b)
soma1=0;
for j=1:i-1
soma1=soma1 + A(i,j)*tx(j);
end
soma2=0;
for j=i+1:length(b)
soma2=A(i,j)*ox(j);
end
tx(i) = (b(i) - soma1 - soma2) / A(i,i);
end
k=k+1;
if abs(max(ox - tx) / max(tx)) > conv
disp('Algoritmo nao converge!');
break
end
if max(abs(A*tx' - b)) > tol
if abs(max(ox - tx) / max(tx)) == 0
disp('Algoritmo travou!');
break
end
end

end
if max(abs(A*tx' - b)) < tol
sprintf('Resolvido na iteracao %d', k)
end
toc
erro = (A* tx' - b)'
x = tx;

x_inversao = (inv(A)*b)'

29.1.04

On verra on verra

Eu estou adotando o sistema do García: o velho sistema de comentários associados a cada post foi substituído por um sistema bem mais estável de guestbook central. Vai ser melhor pra todo mundo assim.

Pessoas, estréiem o meu guestbook. Façam propaganda dos seus blogues, escrevam-me cartas de amor, qualquer coisa. Heiter, isso também vale pra você!

27.1.04

A hipótese Lula


Eu acho que a essa altura já ficou claro que Lula não existe. Lula é uma imagem, um simulacro, uma narrativa, uma hipótese. Eu estava trabalhando com a explicação de que fosse uma imagem gerada por computação gráfica, mas esta boa amiga petista minha me assegura tê-lo visto e tocado. Mas agora tenho uma nova teoria lulogenética

Em um apartamento paulista, dois intelectuais uspianos de esquerda, um mais "organicista" e um mais "vanguardista" entram num debate sobre a possibilidade de um líder realmente popular. O intelectual "organicista" propõe uma aposta-Pigmalião: ele pode transformar um operário num grande líder político.

Depois de um acidente no torno mecânico que o mutilou, o jovem Luis Inácio da Silva recebeu o direito a uma aposentadoria por invalidez, fato que chega à atenção de nosso intelectual organicista. O jovem Luis Inácio é um candidato ideal, visto que não teme mais a reação do burguês. E o resto é história: constrói-se a persona Lula sobre a carcaça conveniente do operário Luis Inácio.

Pois bem: a hipótese Lula é que o intelectual organicista era FHC. Finda a transição de governo, FHC e seu oponente ultrapassado estão dando gargalhadas bebendo champanhe, enquanto a velha equipeconômica pensa - "e pensar que vencemos o ciclo inflacionário brasileiro por causa de uma aposta!".



23.1.04

Como ser solteiro

A guitarra é uma amante ciumenta.

Ela se ressente quando você olha para outros instrumentos, cobra constantemente a sua atenção, e retribui o gelo com gelo: às vezes, você abandona sua guitarra por um dia, e ela te abandona por uma semana. Mas às vezes a relação chega a uma estagnação, e um precisa deixar de ver o outro por algum tempo, até para poder sentir saudades.

Eu estava apagado como uma lâmpada queimada. Guardei os equipamentos todos por três dias, e só os remontei hoje. E ela voltou, a minha doce amada, dócil e colaborativa.

22.1.04

Zeitgeist

Badger badger badger badger badger badger mushroom mushroom badger badger badger badger badger mushroom mushroom.

12.1.04

Poema de uma linha

Os corpos, estas pobres gelecas de papel e queijo cheddar.

16.12.03

Guia Anacoluto da Indústria Pornográfica Brasileira

O início das férias me trouxe uma descoberta tardia: a incrível extensão da indústria pornô-soft na Internet brasileira. Pareceria que todo mundo que ainda tenta sobreviver como empresa de mídia na net tem a sua versão, começando pelo UOL e o Terra, tipicos provedores de conteúdo", passando pelo iG, que se vende meramente como ISP, e chegando à própria Globo.

É incrível, mas o "Paparazzo" da Globo é o mais vulgar da turma, a começar pelo nome. É uma pena, visto que quase por definição eles dispõem das mulheres mais interessantes de se ver seminuas - justamente porque é a própria Globo quem define quem é high-profile no mundo brainless brasileiro. Ora, é preciso muito anti-talento pra conseguir fazer um ensaio vulgar com a Daniela Cicarelli. Às vezes, parece que a Globo tem o tão falado "toque de Midas ao contrário", transformando tudo o que toca em crud.



Surpreendeu a qualidade das meninas que o "Morango" conseguiu cooptar. O iG não têm muito impacto como empresa de mídia, e eu acharia que eles têm pouco orçamento a gastar com o seu departamento de pornografia soft. Mas parece que eles apenas investiram em modelos o que economizaram em fotógrafos. Nunca, nunca vou entender o que leva alguém a pensar que é interessante ver uma menina com as curvas desta tal de Alexandra Denardini com penteado de criança e luvas de borracha. Quer dizer, não basta você saber operar a lente de uma câmera para dizer que é fotógrafo, e este é o testemunho mais vivo disso.



O equivalente do UOL, que repete as metáforas gastronômicas ao se chamar "Chantili - e fico feliz por aprender como se escreve o aportuguesamento dessa palavra. Eles partem de um discurso agressivo, que inclui reportagens sobre sexo na front page, mas o ensaio é a própria definição de soft porn - essencialmente apelativo mas deixando tudo para a imaginação. A modelo (e eles não disponibilizam os ensaios anteriores, de modo que só posso discutir o corrente) é comuníssima, e não sei o que a faz pensar que deveria seguir a carreira. As escolhas do fotógrafo parecem tipicamente de um estudante de algum talento que acabou seu primeiro curso de seis meses de fotografia. É tudo em preto e branco, há um uso relativamente consciente de luzes e sombras, mas é tudo muito básico, muito óbvio, muito direto do livro. Fica a sensação do estudante de música que acabou de descobrir os acordes com nonas, e passa o tempo a compor canções de estrutura previsível, mas acordes com agregadas.



Francamente, o único desses sites que é relativamente aceitável é o "The Girl" do Terra. E enquanto eles não têm precisamente um Alexander Hamilton na equipe de fotógrafos, parece haver a proposta por parte da direção executiva - das pessoas que liberam o dinheiro - de fazer um bom trabalho. Os fotógrafos são competentes e têm alguma personalidade, as modelos em geral têm algum brilho além dos mililitros, e embora seja preciso fazer algum garimpo para encontrar algo parecido com boa fotografia, o abismo entre este projeto e a competição é tal que é preciso elegê-los o Melhor Site Pornô-soft Financiado Por Uma Grande Empresa de Mídia. A direção do Terra pode entrar em contato comigo para receber o seu Prêmio Patinho de Borracha.

Uma dica: os melhores ensaios - do ponto de vista da fotografia - são os mais antigos. Os novos - exemplificados pela primeira foto da esquerda para a direita - estão ficando mais fortes, e a equipe parece não ter aprendido direito a lidar com
o novo foco do site. Alguns dos primeiros ensaios misturam imagens em preto e branco e a cores do mesmo cenário, o que é realmente interessante no conjunto. O meu rápido garimpo não pretende, logicamente, mostrar as melhores, mas uma seleção típica do conteúdo do site.







Rá, rá, rá. Dessa vez surpreendi vocês, não foi?

15.12.03



the rusty chains of prison moon
are shattered by the sun
i walk outside the pilgrim's door
the tournament's begun
the yellow jester does not play
but gently pulls the strings
a lullaby in an ancient tongue
for the court of the crimson king..


10.12.03

Fahrenheit 451

Se algum dos anacolutenses ainda é a favor do estatuto do desarmamento, deve ler isto.

29.11.03

Pingos nos ii

O que realmente incomoda em Lula é a sua forma de sérgiobuarquedehollandamente personalizar relações que deveriam ser inteiramente abstratas. Um Presidente da República pode torcer pela seleção brasileira, mas não pode ter um time.

Só o seu corintianismo assumido seria assunto para longas diatribes sobre o que realmente significa ser um líder nacional, mas na verdade não tem importância, relativa às coisas quer estão sendo feitas. Só para citar duas coisinhas:

  1. É chato pra cacete que um homem alçado a capitão do barco ainda não saiba o que é insider trading. Em apenas dez meses, tivemos dois episódios muito sérios em que o presidente simplesmente deu informação privilegiada a um grupo seleto de investidores antes de que o público em massa soubesse. Com muito menos evidências de um crime semelhante, Chicão Lopes andou na prancha.
  2. A tentativa de dissolução do congresso logo no início do governo. As coisas não foram apresentadas dessa forma, mas o PT nomeou (como no bom tempo dos senadores biônicos) uma assembléia de caráter deliberativo baseado numa idéia difusa de representatividade dos grupos de interesse e de simpatias pessoais. É claro que a representante do povo-do-cinema foi a Lucélia Santos, e não o Diogo Mainardi. Mas a consciência política neste país não está de todo em coma, e houve grita generalizada, o que fez com que o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social seja rebaixado a consultivo, e finalmente silenciosamente varrido para debaixo do tapete.


Ah, a política econômica? Bem, eu tenho a impressão de que cometeram-se erros quantitativos - embora em termos conceituais isso seja mesmo a única coisa que o governo podia fazer. No fundo, o governo só pode executar políticas restritivas de demanda ou políticas expansionistas de demanda. Vocês vêem, a teoria política tradicional propõe que governos tendem a pôr em prática políticas restritivas durante os dois primeiros anos de governo, para poder executar políticas expansionistas nos dois últimos anos e eleger-se em época de vacas gordas. Há quem diga que Lula está abrindo a torneira porque pretende conseguir muitas prefeituras para o seu partido, mas pode ser que a inflação volte logo no fim de seu mandato, e ele não consiga eleger o seu sucessor. Let´s just hope.

20.11.03

Conhecimento nunca é demais, parte I

Este é um estudo sobre a história e o desenvolvimento dos calçados através da idade média, até o século XVI.

18.11.03

Entropia cultural

Aquela coleção de clássicos "econômicos" (leia-se, edições baratas) da editora Claret, que andou publicando coisas do Gramsci e até mesmo o Livro Vermelho de Mao, agora inclui dois livrinhos de Ralph Waldo Emerson. Com bandeira americana na capa e tudo :)

Agora só falta alguém lembrar de fazer uma réplica àquela coleção de "Rebeldes Brasileiros" da Caros Amigos. Ela bem que merecia ser mais conhecida pelos nossos estudantezinhos.

14.11.03

I will hold the tea bag



















Eu estou chegando a uma teoria: as pessoas não entendem direito as minhas diatribes sobre música por causa do incomensurável abismo entre o fenômeno da música popular num país como o Brasil e num país como a Inglaterra ou a Holanda. Em sociedades assim, coisas surpreendentemente sofisticadas se tornam bastante populares, enquanto no Brasil, coisas incrivelmente idiotas são alçadas à categoria de música popular "culta".

Precisamos abrir o mercado musical à competição internacional - dentro da cabeça das pessoas! Gente exposta diariamente a The Sea and Cake, Bark Psychosis ou Univers Zero teriam nojo da Maria Rita - e as gravadoras seriam forçadas a lançar bons artistas. Às vezes me parece que coisas como a Kelly Key ou os funkeiros do morro são lançados como sparrings, bois de piranha - comparados com _aquilo_, os Tribalistas ou a Maria Rita ou o novo disco da Olivia Hime valem alguma coisa.

E não ouse reclamar, ou as gravadoras voltam a descobrir um Buchecha qualquer ali na padaria.


31.10.03

Eu errei


ao assumir que os cortes de impostos de Bush Jr. eram uma repetição da reaganomics que mais de uma vez havia enfiado o país na jaca.

O PIB americano cresceu 7% no último período. E isso é inequívoco. Dado isso, arriba Greenspan y arriba Schwarzenegger. Nós bem que podíamos tomar umas lições com esse pessoal.

26.10.03

Neuroquímica I

Pessoas gordas são viciadas em coisas doces (em particular o chocolate) que estimulam a produção de dopamina. Não é muito diferente do que faz o álcool.

Pesoas malhadas são viciadas em endorfina, que é produzida pelo organismo quando se atinge um certo grau de esforço físico. Não é muito diferente do que faz a heroína.

Eu olho para homens malhados, musculosos, ou meninas magrinhas, que nitidamente passam horas na academia para ter esse corpinho, como olho para viciados em maconha: casos tristes em que a sensação física se sobrepõe ao espírito humano.

19.10.03

Estratégias Vencedoras


Não é o tipo de coisa que costuma aparecer no Anacoluto, mas parece que o pessoal do FreeBSD, um sistema operacional padrão Unix gratuito melhor que o Linux resolveu contratar os publicitários brasileiros que fazem aquelas campanhas de cerveja.

O pior é que deve funcionar. Nada contra loiras sorridentes em trajes menores, mas eu gostaria de que tivessem escrito "really" certo.

16.10.03



"Blue", do Bark Psychosis, é o cumprimento de uma promessa que vinha sendo feita havia anos por bandas como New Order, Joy Division e Talk Talk. Nada, em toda a música dos anos 80, tem este grau de conteúdo emocional. É acachapante. E o que dizer da coda fake-tropical que termina a faixa?

Talvez involuntariamente, o final de "Blue" é uma refutação da música brasileira.

Parte do problema da música brasileira é que ela nunca conseguiu se sentir segura estéticamente para ser, em si mesma, e sempre se afirmou na sua natureza de projeto. Ainda estranha alguns a possibilidade de alguém poder gostar de música por causa da música. Outro dia, me perguntaram de onde são os Bark Psychosis. E eu não sei.

As pessoas costumam vincular organicidade a emotividade, e pode ser uma surpresa a força emocional que a sintética pura e os vocais sussurrados do Bark Psychosis podem ter. A única linha de guitarra, que antecede e introduz o piano tropical a que eu me referia, diz mais sobre a extensão e a complexidade das emoções de pessoas de verdade do que décadas de Chico Buarque e Elis Regina.

Bark Psychosis personifica até o fim a idéia que só recebeu nome com os chatos australianos do Silverchair: emotion sickness. Você sabe quando você tem tantas emoções misturadas e contraditórias em relação a uma coisa só que se sente fisicamente mal?

Qualquer um que já botou a cabeça pra fora da caixa sabe do que eu estou falando. Qualquer um que vive seus relacionamentos para além da pragmática do sexo e da companhia do sábado à noite e do medo de ficar sozinho sabe do que eu estou falando. "Sentimentos" são kits pré-embalados de emoções que as pessoas se permitem revelar porque têm esferas semânticas bem definidas ao seu redor. Amor romântico significa sexo e cinema no sábado à noite; amizade significa telefonemas depois daquela prova difícil e simpatia nas dificuldades. Relações entre colegas de trabalho são objetivas, exceto no chopinho de sexta à noite. O cliente sempre tem razão, especialmente numa loja de sapatos.

Só que as coisas são mais complicadas do que isso, e algumas pessoas mais inteligentes sabem disso. Gosto de pensar que o fato de que mais de 80% das visitas ao Anacoluto vêm de universidades significa que tenho leitores inteligentes. E os meus leitores inteligentes sabem que o mundo de Dawson's Creek não existe. É disso que o Bark Psychosis está falando: da vida fora da caixa.

15.10.03

Eu acentuo advérbios,

quando vêm de adjetivos acentuados. E espero que os críticos vão embora para Pasárgada, onde os seus diplomas da Estácio talvez valham a cartolina em que foram impressos.

24.9.03

Rádio

A partir de hoje, transmitirei a Rádio Anacoluto todos os dias das 19 às 20 horas, horário de Brasília. A sessão poderá ser sintonizada por qualquer um que seja capaz de tocar mp3's. Basta abrir http://anacoluto.no-ip.info:8000/ no seu programa de mp3 ou clicar aqui.

A programação será variada e eclética - portanto, mesmo se você não gostar do que está ouvindo, deve apenas esperar dois ou três minutos, que coisas radicalmente diferentes virão. Hoje, pretendo tocar um pouco de Bark Psychosis e Laibach (já que os mencionei num post recente), além de um pouco de jazz-rock sueco. Pedidos podem ser enviados ao meu ICQ: 3189502.

23.9.03

Sinais

Se houver uma correlação entre o cenário musical e o panorama econômico, teremos um novo 1979 em breve.

Grandes Esperanças

Novo Laibach e Novo Bark Psychosis, no mesmo mês.

Mas é preciso esperar. Como fazer melhor que "N.A.T.O" e "Hex"?

22.9.03

Ritmo

Quem ainda acha que as coisas da Nação Zumbi ou da Timbalada tem algum mérito, deve ouvir a versão ao vivo de "For nobody" do Gentle Giant. Começa com um sexteto de percussão executado pelas mesmas seis pessoas que tocam órgãopianoxilofoneguitarrasbaixosviolinosviolasvioloncelostrompetessaxofonesviolõesflautasdocesflautastransversasetc.

É de perder o fôlego.

E que não me venham falar de Maria Rita. Maria Rita é coisa de colunista de caderno de cultura.

19.9.03

As palavras

Alma, bergantim, choque, dasein, errante,feitura, gestalt, hiato, irradiação, janela, knock-out, lanterna, metástase, nervura, oblivion, pão&circo, questionamento, rizoma, santidade, tempo, unidade, velocidade, wanton, xilofone, zeitgeist.

16.9.03

Cinqüenta anos em cinco

Uma fatia aleatória de cultura Internet para aqueles que chegaram tarde.

15.9.03

O mistério da MPB

O que eu nunca entenderei é o porquê de tanta gente - em particular gente em outros aspectos esclarecida - que acha que Elizete Cardoso, Aldir Blanc, Elis Regina, Milton Nascimento ou Tim Maia têm alguma relevância whatsoever. Principalmente na era que produziu John Coltrane, John McLaughlin, Ravi Shankar, Thurston Moore, Glenn Branca, Trent Reznor e Tom Jenkinson. É uma lista em que predominam os estrangeiros, e há um númeor de razões para isso - da estatística (e mais de 95% das pessoas do mundo são estrangeiros) ao clima cultural mediocregênico em que nos desenvolvemos. Por último, há a dificuldade em se descobrir que existem artistas como Egberto Gismonti, Arrigo Barnabé, Renato Consorte, Airto Moreira, Arto Lindsay e tantos outros. Quando as rádios querem dar uma de cultas, jogam um Chico Buarque da fase ruim.

It's a sad state of affairs. E a maior parcela da culpa é da classe média.

11.9.03



8.9.03

Saindo da sombra

Agora você pode conversar com Diego "Anacoluto" Navarro através do ICQ. O número é 3189502.

6.9.03

Saudades de Fernando Henrique



Não, não é nem a recessão. As causas da recessão nunca são certas, mesmo quando estamos armados da melhor teoria econômica. Ainda sou dos que opinam que o governo anda improvisando na condução da quimioterapia da estabilização, mas não há heterodoxia completamente equivocada. Sim, a vulnerabilidade externa é um problema; sim, todo programa de estabilização inflacionária implica em um choque recessivo de demanda; sim, improvisou-se na combinação explosiva de política fiscal expansiva e tributação para tapar os gastos que a oposição não deixou que se cortasse - levando a dívida pública à alarmante situação em que está. A questão é que tudo isso são pedaços soltos de teoria sujeitos a uma interpretação leiga. E, sim, uma política recessiva pode ser razoável dadas certas circunstâncias, em que pese a carga negativa da palavra. Tudo é uma questão de custo-benefício. Valia a pena arcar com a vulnerabilidade externa, o crescimento baixo e o peso morto do Estado? Ah, isso é uma discussão tão grande...

Não, não é nem a recessão. É o ar que se respira.

São as pequenas coisas. É o populismo barato dos showzinhos de música - mesmo quando envolvem os maiores músicos deste país, como aconteceu no recente evento com Nelson Freire em prol do fomezero. É a exortação pernambucana a provar a macheza engravidando as que vierem pelo caminho. É o exílio da técnica e a promiscuidade clientelista que toma conta de cada aresta da máquina estatal. Não é apenas que a quimioterapia econômica esteja sendo levada adiante por médicos e engenheiros - são as indicações políticas para o INCA e a Câmara Técnica de Medicamentos, que estão provocando renúncias em massa. É o Conselhão de Desenvolvimento Econômico e Social, que quase virou parlamento paralelo eleito pelo presidente. É a personalização das relações políticas. É o presidente da Petrobrás anunciando a descoberta de gás em Santos para um grupo seleto de investidores. Sim, isso aconteceu. E Madam Roussef anda a minimizar esse inacreditável episódio de insider trading patrocinado pelo Estado.

Em suma, é a era Sarney de volta. E não se enganem, Sarney é a grande inspiração de Lula em quase tudo, das câmaras setoriais ao populismo em torno da palavra "social". É a desprofissionalização do Estado, a reversão de um processo que estava transformando em espírito a forma como se faz política chez nous.

Com toda a turbulência que marcou o período, Fernando Henrique deixou a nítida sensação de uma era em que se governou tentando infiltrar a técnica e a razão num espaço tão típicamente marcado pelo fisologismo mais barato e mais imoral. E nisso, fica a sensação de que FHC é maior do que o próprio PSDB, chegando a validar o projeto tucano pela força de seu próprio mito. Fico com a sensação de que o apoio explícito de FHC a José Serra teria mudado muita coisa.

Muito se regurgia sobre a força de Lula, o Sarney Reloaded, como líder carismático, e acho que se subestima a força de FHC. Adolescente, eu fui de esquerda - freqüentemente da marca mais radical, sem que nunca tenha chegado a mim o apelo de Lula ou a crítica fácil a FHC. No máximo, cometiam-se erros de cálculo, nas privatizações e na abertura comerical - que, na minha imaturidade eram o mal encarnado - sem que isso significasse que FHC não fosse o rei-filósofo que terminaria por fazer o que fosse melhor dadas as circunstâncias. Talvez o erro de FHC tenha sido ser sutil, sofisticado. Talvez a sociologia e o piano só façam falta a nós, pobres adeptos deste hedonismo intelectual vagamente proustiano.

Talvez os candidatos a presidente pudessem ser submetidos a um exame de piano antes de serem validados pelo TSE.

Tenho saudades do professor Cardoso toda vez que Luís Inácio Sarney Reloaded da Silva abre a boca para dizer que "nunca antes neste país" se fez alguma coisa. Tenho saudades do professor Cardoso quase o tempo inteiro.

2.9.03

O mundo vai ser tomado pelas baratas. Merde.

29.8.03

Conjux


É do tipo de coisa que você detesta à primeira vista, antes mesmo de ouvir. Não tem como funcionar: Tom Morello e Zack de la Rocha faziam hip-hop político, pontuado por guitarras, enquanto que Chris Cornell e amigos faziam música psicodélica retrô. Substituir a paranóia e o vitríolo do RATM pelo tom whiny e introspectivo de Cornell é ainda uma idéia menos inadequada do que substituir a relativa expertise de Matt Cameron, Ben Shepherd e Kim Thayill pelas incríveis palhaçadas de Tom Morello, que parece achar que repetir uma única nota por vários minutos, usando pedais de efeitos, é o mesmo que tocar um solo.

O pior é que o que os Audioslave fazem é terrívelmente reacionário - especialmente no contraste com os beats hipervelozes para uma época hiperveloz das coisas da Weltherrschaft, que lançou o disco sobre a guerra que comentei no último post. O clipe de "Show me how to live" explora a surradíssima fórmula da road freedom como um veterano marine, ao ver a oposição à guerra do Vietnã, exploraria as imagens patrióticas da bandeira, do cachorro-quente e do beisebol. Talvez involuntariamente, Chris Cornell assume o papel de um Pat Boone na era da dromologia de Paul Virilio, o que dá a todo o disco um sabor de ciclamato - apesar de todas as boas intenções, repulsivo.

Mas como não gostar de algo cantado pelo Chris Cornell?

28.8.03

Às vezes, as pessoas fazem as coisas mais fantásticas com os objetivos mais tolos. Este EP, disponível para download gratuito legal, é um grande exemplo.

Não é nem um drill-and-bass esperto como as coisas do Squarepusher; é uma impressionante explosão de energia que dura trinta minutos. Vale a pena.

27.8.03

Real World

As trajetórias simétricas e equivalentes de Jewel e Alanis são um exposé involuntário de como funciona a indústria musical. E ambas fazem o seu trabalho muito bem. Não ouvi o álbum de disco diva que Alanis tenta esconder para proteger a sua retórica de "tenha cabelo de cavalo e ande nua por cidades geladas", mas a priori "You oughta know" ou "Head over heels" são tão convincentes quanto qualquer coisa da Cat Power ou da Patti Smith. A Jewel me surpreendeu. Talvez haja uma mudança forte de rumos em relação ao autenticismo que dominou o rock (em oposição à eletrônica, muito mais esperta) na primeira metade dos anos 90, ou talvez o mercado de cantoras sinceras e frágeis esteja superlotado ao ponto de se tornar notória a diferença entre cantoras sinceras e Madonnas bem emabaladas.

O crivo de Eratóstenes são os solos de guitarra. Se a música tiver mais tempo de refrão do que de solos, laisse tomber.

20.8.03

Uma pequena paráfrase


I don't know just where I'm going
But I'm gonna try for the kingdom, if I can
'Cause it makes me feel like I'm a man
When I put black powder in hot milk
And I'll tell ya, things aren't quite the same
When I'm rushing on my run
And I feel just like Jesus' son
And I guess that I just don't know
And I guess that I just don't know
I have made the big decision
I'm gonna try to speed up my life
'Cause when the blood begins to flow
When it shoots up the dropper's neck
When I'm closing in on death
And you can't help me now, you guys
And all you differentials with all your limits
You can all go take a walk
And I guess that I just don't know
And I guess that I just don't know
I wish that I was born a thousand years ago
I wish that I'd sail the darkened seas
On a great big clipper ship
Going from this land here to that
In a sailor's suit and cap
Away from the big city
Where a man can not be free
Of all of the evils of this town
And of himself, and those around
Oh, and I guess that I just don't know
Oh, and I guess that I just don't know

Caffeine
be the death of me
Caffeine
it's my wife
and it's my life

Because a mainer to my brain
Leads to a center in my head
And then I'm better off and dead
Because when the smack begins to flow
I really don't care anymore
About all the health freaks in this town
And all the physicians makin' crazy sounds
And everybody puttin' everybody else down
And all the scrap paper piled up in mounds
'Cause when the smack begins to flow
Then I really don't care anymore
Ah, when the caffeine is in my blood
And that blood is in my head
Then thank God that I'm as good as dead
Then thank your God that I'm not aware
And thank God that I just don't care
And I guess I just don't know
And I guess I just don't know

13.8.03

Browser

Troquei o MSIE, que andava aprontando, pelo Mozilla Firebird.

Lembram da guerra dos browsers? [Ok, nem todo mundo era um geek viciado em internet em 1997]. Quer dizer, depois de certo ponto, a Netscape tinha se tornado um mamute.

Uma das últimas coisas que o Marc Andressen fez como dono da Netscape, antes da venda para a AOL, foi liberal o código fonte do Navigator.

Lembro ainda de baixar e compilar uma das primeiras versões do Mozilla - originalmente o nome extra-oficial do Navigator, mas que se tornaria o nome oficial do novo browser - mas a coisa simplesmente não funcionava direito back then.

O Mozilla continua existindo. Dizem que funciona, e que está virando um mamute. Mas eles fizeram uma versão menor, redimensionável - o Firebird.

O conceito é bastante esperto: em vez de afogar o browser em recursos, você baixa uma instalação padrão bare-bones e vai instalando os recursos adicionais que forem interessantes.

E sim, eles conseguiram trazer alguns conceitos novos à cansada arena dos browsers. Vale a pena experimentar.

10.8.03

De ratos e homens

Eu não sei qual é a surpresa em ver Roberto Marinho-latria que tomou conta da imprensa. Não é somente o risco moral de não bajular o chefe; há também um forte elemento de gratidão por parte de muita gente que teve o seu big break na corporação Globo.

E apesar do perpétuo fluxo de acusações perturbadoras sobre a gênese e ascensão da corporação Globo - e do inegável caráter cartelizador de seu monopólio vertical sobre o audiovisual de ficção - Roberto Marinho foi um empreendedor. E este país tem uma carência terrível de empreendedores; as pessoas querem emprego, de preferência no governo, com estabilidade.

É, afinal, o homem que fundou uma das poucas grandes empresas que este país tem - aos 60 anos - e que emprega artistas. É por causa do salário das novelas da Globo que atores podem fazer "Rei Lear" ou "Hamlet".

E no fundo, eu acho que ele acumulou tanto poder em grande parte por falta de concorrência em determinado ponto crítico da construção de seu império. É certo que nenhuma sociedade capitalista desenvolvida deveria ter os entraves à livre concorrência que a Globo representa. Mas this is what you want, this is what you get.

As pessoas não querem emprego para todos, sem ter que correr riscos?

30.7.03

Anticomunista, eu?


(Ei, meninos. O link vale; só me mudem para a seção de "blogs".)

26.7.03

A quantidade de comentários que são deixados é completamente incompatível com as estatísticas do Nedstat.

Ei. Pessoas. Deixem comentários.

23.7.03

This is revolution

Muitas das disciplinas da soft-science que surgiu em torno da desconstrução e da psicanálise no século passado são jogos sem fim. O próprio relativismo é um jogo sem fim, fato apontado por gerações de cínicos: afinal, mesmo a proposição "tudo é relativo" deveria ser relativa, certo?

A pragmática - subdisciplina da lingüística - pode ser um jogo-sem-fim de conseqüências interessantes. O exemplo clássico de análise pragmática de uma fala é o "eu te amo". Aparentemente, para os lingüistas da pragmática, uma afirmação como essa traz, implícita, uma indagação acerca da recíproca: você diz "eu te amo" para saber se é correspondido.

Nessa linha de análise, o que está incluído no pacote quando eu resolvo fazer uma defesa do ethos do substância-acima-de-estilo?

Eu consigo ver duas coisas. A primeira é uma analogia tola. A forma de apresentar o problema ajuda, dado o nosso centenário treinamento para a indução a qualquer custo: estilo frilly, substância frilly. A outra é uma dicotomia. Nem sempre o estilo sabotará a substância; faz parte do rol de utilidades do estilo a função de mimetizar o efeito de uma substância sólida e qualitativa.

Nesse caso, o discurso da substância-acima-do-estilo se adaptará: um estilo adequado será um sucedâneo de substância mais fácil de obter, mas de muito menor qualidade. Desta hierarquia, emerge o idealismo quixotesco: apesar de ser mais fácil, opto por priorizar a substância. Do quixotesco, surge o heroísmo: priorizarei a substância desprezando o estilo. E daqui, a pura arrogância: a minha substância é tão boa que não preciso de um estilo atraente.

Na verdade, eu mudei o template porque queria mais espaço. Fiquei sériamente tentado a sair com um discurso de substância-acima-de-estilo que reaproveitasse a contingência ruim de um template feito pela metade, que será acertado aos poucos e a transformasse em ethos. Por quanto tempo eu conseguiria levar adiante uma farsa assim?

Não vale a pena. Os meus leitores são mais espertos que isso.

21.7.03

Tom Kriss



17.7.03

Baixo

Estou com um baixo elétrico emprestado. Vocês sabiam que o braço do baixo tem duas oitavas?

A minha velha teoria de que qualquer guitarrista toca baixo sobreviveu. O instrumento tem algumas dificuldades mecânicas (o braço é maior, as cordas mais afastadas), mas a afinação é a mesma das quatro cordas mais graves da guitarra, e as cordas oferecem muito mais sustain mesmo sem nenhum tipo de distorção - o que mais que compensa a falta de uma palhetada alternada na mão direita.

Algo inteiramente distinto é ter idéias de baixo. O guitarrista de rock usualmente é treinado para preencher espaço: o tema recorrente nos grandes solistas de guitarra é como a intensidade nunca cai. Por outro lado, o baixo faz das notas que não está tocando sua matéria-prima básica. Requer alguma sutileza, algum feeling. Requer também uma certa sintonia fina com a bateria.

Mas pelo geral, é um instrumento mais fácil. Enquanto eu talvez nunca seja um bom guitarrista, posso aprender a ser um ótimo baixista em mais uns dois meses. Vale a pena? A tentação é grande - afinal, as exigências que se fazem de um guitarrista são irracionalmente mais altas do que as sobre qualquer outro instrumentista. Houve um Jaco Pastorius (roughly, um McLaughlin do baixo), mas não houve Hendrix, Howe, Van Halen, Fripp, Holdsworth, Buckethead. E puxa, há guitarristas impressionantes em cada esquina.

Um mundo menos competitivo. É tentador. Talvez, dadas circunstâncias apenas um pouco diferentes, eu tivesse sido um matemático baixista, e não um economista guitarrista. Em todo caso, continuo à cata de um baterista.