O Steven Wright - um INTP entre os INTP's - freqüentemente conta uma história supostamente verídica de como, por volta dos oito anos, teria ido se queixar a uma professora no final da aula.
"I don't get it", dizia ele. A professora, provavelmente uma dessas moças prestativas mas essencialmente clueless em relação às nervuras do real - não muito diferente de D. Ottalice - respondeu algo do tipo "O que, precisamente, você não entende?"
"What, exactly, don't you get?". Apontando para a rua, para as pessoas, o jovem Steven Wright responde:
"Just in general. I don't get it."
Este é um mundo realmente esquisito, mesmo para pessoas inerentemente melhor adaptadas a ele, como a Ralissa. Em recente ensaio no Tostando M., ela discorre de modo meio amorfo sobre tipos de amizade.
A verdade é que eu não entendi muita coisa, e acabei deixando um comentário que em linhas gerais eu conhecia dois tipos de pessoas - aquelas de que gosto, e aquelas que são como vegetação com pernas e bocas, uma espécie ambulante da Grande Planta do filme "Little Shop of Horrors".
Eu sempre fui bastante positivo em relação a não trabalhar com categorias confusas, e usar de modo naïf as idéias dicotômicas de gostar e não gostar. E isso pode ser muito problemático, porque as relações que as pessoas estabelecem acontecem dentro de um espectro muito denso, e acaba que eu não consigo estabelecer uma diferença entre a Aninha Rebel, que me procura quando ela está deprimida, e a Ralissa, que me procura quando eu estou deprimido.
Pareceria que eu tenho muitos amigos. No total devem ser umas quinze pessoas, mas são pessoas tão ricas, e tão diferentes, que fica a sensação de que são muito mais.
Outro dia, na pressa de encontrar uma moldura teórica que fizesse sentido e me permitisse fugir de uma conversa mais emocional, defini "amizade" como uma "cooperativa de seguro existencial". E é verdade que você começa a gostar das pessoas por alguma razão específica - o Cláudio, porque ele me relembra do que posso ser, o Caio, porque ele me lembra que se der tudo errado, não será uma catástrofe digna de suicídio ritual japonês, o Yie Chen, porque me lembra de que há pessoas como eu perambulando pelo mundo, a Ralissa, porque ela me lembra que é ok ser uma pessoa realmente estranha, o Bernardo, porque ele me faz ter certeza que é possível ir até o topo tendo as melhores intenções - e inclusive a Aninha Rebel - porque, quando ela aparece, me relembra de que a minha angústia não é única, e que everybody hurts.
Conversar com essas pessoas (às vezes simplesmente estar com essas pessoas) sempre aliviou o mal-estar essencial ao morar em um mundo que não é o seu mundo, mas é um mundo construído espontânea e histericamente por e para ESFJs espontâneos e histéricos.
Claro, por pura lógica, o mero fato de saber que essas pessoas existem seria o suficente para lidar com o mal-estar. O estranho é que mesmo para além do efeito terapêutico sobre a minha inadaptação fundamental, eu continuo gostando delas. O mundo é tão mais rico com elas dentro.
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