Anacoluto: caffeine for the mind, pizza for the body, sushi for the soul.

"We're not, as some people maintain, obsessed with pop culture so much as we're obsessed with its possibilities for stratification and dateability." (Thurston Moore)

8.3.04



O Steven Wright - um INTP entre os INTP's - freqüentemente conta uma história supostamente verídica de como, por volta dos oito anos, teria ido se queixar a uma professora no final da aula.

"I don't get it", dizia ele. A professora, provavelmente uma dessas moças prestativas mas essencialmente clueless em relação às nervuras do real - não muito diferente de D. Ottalice - respondeu algo do tipo "O que, precisamente, você não entende?"

"What, exactly, don't you get?". Apontando para a rua, para as pessoas, o jovem Steven Wright responde:

"Just in general. I don't get it."



Este é um mundo realmente esquisito, mesmo para pessoas inerentemente melhor adaptadas a ele, como a Ralissa. Em recente ensaio no Tostando M., ela discorre de modo meio amorfo sobre tipos de amizade.

A verdade é que eu não entendi muita coisa, e acabei deixando um comentário que em linhas gerais eu conhecia dois tipos de pessoas - aquelas de que gosto, e aquelas que são como vegetação com pernas e bocas, uma espécie ambulante da Grande Planta do filme "Little Shop of Horrors".

Eu sempre fui bastante positivo em relação a não trabalhar com categorias confusas, e usar de modo naïf as idéias dicotômicas de gostar e não gostar. E isso pode ser muito problemático, porque as relações que as pessoas estabelecem acontecem dentro de um espectro muito denso, e acaba que eu não consigo estabelecer uma diferença entre a Aninha Rebel, que me procura quando ela está deprimida, e a Ralissa, que me procura quando eu estou deprimido.

Pareceria que eu tenho muitos amigos. No total devem ser umas quinze pessoas, mas são pessoas tão ricas, e tão diferentes, que fica a sensação de que são muito mais.

Outro dia, na pressa de encontrar uma moldura teórica que fizesse sentido e me permitisse fugir de uma conversa mais emocional, defini "amizade" como uma "cooperativa de seguro existencial". E é verdade que você começa a gostar das pessoas por alguma razão específica - o Cláudio, porque ele me relembra do que posso ser, o Caio, porque ele me lembra que se der tudo errado, não será uma catástrofe digna de suicídio ritual japonês, o Yie Chen, porque me lembra de que há pessoas como eu perambulando pelo mundo, a Ralissa, porque ela me lembra que é ok ser uma pessoa realmente estranha, o Bernardo, porque ele me faz ter certeza que é possível ir até o topo tendo as melhores intenções - e inclusive a Aninha Rebel - porque, quando ela aparece, me relembra de que a minha angústia não é única, e que everybody hurts.

Conversar com essas pessoas (às vezes simplesmente estar com essas pessoas) sempre aliviou o mal-estar essencial ao morar em um mundo que não é o seu mundo, mas é um mundo construído espontânea e histericamente por e para ESFJs espontâneos e histéricos.

Claro, por pura lógica, o mero fato de saber que essas pessoas existem seria o suficente para lidar com o mal-estar. O estranho é que mesmo para além do efeito terapêutico sobre a minha inadaptação fundamental, eu continuo gostando delas. O mundo é tão mais rico com elas dentro.