Anacoluto: caffeine for the mind, pizza for the body, sushi for the soul.

"We're not, as some people maintain, obsessed with pop culture so much as we're obsessed with its possibilities for stratification and dateability." (Thurston Moore)

27.7.04

Semente de idéia

Marx é fundamental na história do pensamento econômico porque leva a teoria do valor intrínseco (derivado do trabalho) aceita por gente boa como Adam Smith e David Ricardo até suas últimas conseqüências, e demonstra, através do conceito de mais-valia, que o capitalismo é intrinsecamente injusto, e provavelmente inviável.

O ponto fundamental da discordância entre pessoas como eu, o Claudiux e o García e marxistas (mesmo que sejam por gut instinct ou educação - o que acontece a muita gente boa, como a Aninha Rebel) é precisamente a teoria do valor intrínseco. A partir dos marginalistas (na verdade, dos utilitaristas, mas estamos pensando em economia), o valor passa a derivar da utilidade, e demonstra-se que em determinadas condições, o valor de mercado reflete o valor-utilidade. É nessa identidade que uma doutrina liberal/libertarian racional se apóia.

A parte burra da esquerda optou por ideologizar-se, mas algumas pessoas espertas (vide Debord) centraram-se em criticar as premissas das quais se deriva a identidade valor de mercado-valor utilidade. Ainda voltarei muito a Debord, que desconstrói de maneira muito inteligente a racionalidade instrumental necessária à Identidade Liberal (termo que acabo de inventar :-)) montando uma teoria da alienação muito mais inteligente que a sustentada pelos marxistas militantes de hoje. Tal teoria da alienação explicaria o fenômeno Apple: engenharia ruim, marketing excelente, valor de mercado alto.

O problema é que para a grande maioria dos mercados vitais à infra-estrutura material sobre a qual nossa forma de viver se apóia, as premissas do equilíbrio geral valem - retornos decrescentes de escala, racionalidade instrumental, informação simétrica, etc. Não há, nessas bases, justificativa racional para postular uma inviabilidade do capitalismo, ou mesmo a desejabilidade (ergh) de uma revolução anti-mercados. Isto é, empiricamente, ao admitir o valor-utilidade, o marxismo se sabota, posto que a força de sua estrutura depende
fundamentalmente do valor intrínseco.

Desta forma, a única forma de salvar a esquerda e o marxismo - ao menos do ponto de vista da razão, do projeto socrático, da causa helênica - é centrar esforços no valor intrínseco, ou seja, construir uma ontologia materialista, uma framework dentro da qual se derivaria e demonstraria o valor das coisas. Isso forçaria todo o corpo da economia pós-marginalista que se apóia no valor-utilidade a aguçar a defesa desse princípio fundamental para além das objeções epistemológicas à possibilidade pragmática de um planejamento econômico (que em si implica em uma ontologia implícita, ou ao menos uma hierarquia dos valores).

Claro, é preciso que esta ontologia fuja das armadilhas típicas encontradas pelas teorias de organização industrial das economias planificadas. É preciso que seja dinâmica, endogeneizando a mudança constante de motivações por trás do que os homens entendem como realização para suas vidas. É preciso também que seja auto-sustentável por um sistema de regras estável, razão pela qual a teoria dos jogos precisa estar presente nela o tempo inteiro. Não podemos, simplesmente, confiar na ação positiva de uma burocracia.


Ei, você, leitor aleatório do Anacoluto. Se você resolver levar esta idéia à frente, eu quero crédito. Aliás, faça-me participar do seu projeto. Eu estou disposto a trabalhar com um marxista, mas não com essas massas educadas numa vulgata anti-mercados de vagas considerações humanistas. Se você entende do que eu estou falando, já é um bom começo. Eu tenho Orkut, procure-me.