Anacoluto: caffeine for the mind, pizza for the body, sushi for the soul.

"We're not, as some people maintain, obsessed with pop culture so much as we're obsessed with its possibilities for stratification and dateability." (Thurston Moore)

21.12.02

A escola de comunicação da UFF sempre se empenhou em transmitir um vago relativismo gnoseológico, sofisticado até o infinito pelas mais diferentes perspectivas (sociologia, antropologia, lingüística), mas em essência um vago relativismo. Conceitos típicos são, por exemplo, "processo de subjetividade" ou "historicidade dos significados". Duas frases muito representativas são "Vemos o mundo através de filtros que são históricos" e (supremo non sequitur) "A emergência das ciências humanas é vinculada às estratégias de produção do capitalismo novecentista".

O "senso crítico" da comunicologia é, portanto, essencialmente um conjunto de versões sofisticadas do velho argumento ad hominem. O discurso, o argumento são vinculados a quem os produz e logo ao porquê de serem produzidos. Lembro de, já no processo de acordar desse sono relativista induzido, algumas conversas com as pessoas da UFF. Não eram debates, própriamente, mas exercícios amorfos de soul searching. Nesses últimos meses, passou a preocupar-me o problema de achar razões válidas para a ação política - ou seja, razões extra-ideológicas.

Lembro de uma frase em particular. "A minha professora de Análise do Discurso disse que há ideologia implícita em todo juízo". Mais do que mero relativismo metafísico, essa idéia introduz uma paralisante paranóia do quo bono sobre toda atividade intelectual. Estamos, na verdade, substituindo o simplismo monista da verdade-única pelo simplismo porra-louca do tudo-depende.

Na verdade, tudo depende mesmo, mas isso não significa que não exista conhecimento, não exista cultura, não exista civilização. Fiquei paralisado nessa dicotomia por muito tempo. O relativismo é uma conclusão racional, mas é também um declive escorregadio para a irracionalidade, à barbárie. E claro, o monismo racionalista é completamente irracional, tem inúmeros problemas.

Tudo aqui horrívelmente simplificado, é claro. Tudo tem suas nuances. O objetivo desta narrativa toda é falar do ovo de Colombo. Recebi um e-mail de um amigo inteligente com algumas divagações sobre a verdade, sobre a produção de verdade, sobre a natureza da verdade. O que respondi segue, um pouco modificado.

Uma das coisas mais importantes que já aprendi é a separar premissas e conclusões.

Uma forma muito cômoda de estudar economia seria um intelectualismo veloz à francesa. Alunos de esquerda questionariam o modelo neoclássico porque supõe que já existem plenamente racionalidade e igualdade política e competiçào perfeita, e portanto seriam espertos, teriam senso crítico.

O que vi na PUC é diferente. A PUC tem dois tipos de alunos, competentes e incompetentes. Todos ficam sabendo desde o início que são modelos, modelos baseados em premissas e que levam a conclusões. Discordar das premissas não faculta o direito de ignorar o modelo.

Essa perspectiva, esse modo de se aproximar de um problema é muito, muito poderoso. Revejo agora as discussões, os problemas, os debates da UFF espalhados desordenadamente pelos meus cadernos, e tenho vontade de modelá-los como se faz modelos em economia.

Resolve o duplo problema da politização versus dogmatismo. E permite restaurar o gosto pela lógica nos assuntos cinzentos. Sim, tudo isto é um pouco óbvio, mas passar a pensar o mundo dessa forma é um grande salto. Um grande salto.