Semente de idéia
Marx é fundamental na história do pensamento econômico porque leva a teoria do valor intrínseco (derivado do trabalho) aceita por gente boa como Adam Smith e David Ricardo até suas últimas conseqüências, e demonstra, através do conceito de mais-valia, que o capitalismo é intrinsecamente injusto, e provavelmente inviável.
O ponto fundamental da discordância entre pessoas como eu, o Claudiux e o García e marxistas (mesmo que sejam por gut instinct ou educação - o que acontece a muita gente boa, como a Aninha Rebel) é precisamente a teoria do valor intrínseco. A partir dos marginalistas (na verdade, dos utilitaristas, mas estamos pensando em economia), o valor passa a derivar da utilidade, e demonstra-se que em determinadas condições, o valor de mercado reflete o valor-utilidade. É nessa identidade que uma doutrina liberal/libertarian racional se apóia.
A parte burra da esquerda optou por ideologizar-se, mas algumas pessoas espertas (vide Debord) centraram-se em criticar as premissas das quais se deriva a identidade valor de mercado-valor utilidade. Ainda voltarei muito a Debord, que desconstrói de maneira muito inteligente a racionalidade instrumental necessária à Identidade Liberal (termo que acabo de inventar :-)) montando uma teoria da alienação muito mais inteligente que a sustentada pelos marxistas militantes de hoje. Tal teoria da alienação explicaria o fenômeno Apple: engenharia ruim, marketing excelente, valor de mercado alto.
O problema é que para a grande maioria dos mercados vitais à infra-estrutura material sobre a qual nossa forma de viver se apóia, as premissas do equilíbrio geral valem - retornos decrescentes de escala, racionalidade instrumental, informação simétrica, etc. Não há, nessas bases, justificativa racional para postular uma inviabilidade do capitalismo, ou mesmo a desejabilidade (ergh) de uma revolução anti-mercados. Isto é, empiricamente, ao admitir o valor-utilidade, o marxismo se sabota, posto que a força de sua estrutura depende
fundamentalmente do valor intrínseco.
Desta forma, a única forma de salvar a esquerda e o marxismo - ao menos do ponto de vista da razão, do projeto socrático, da causa helênica - é centrar esforços no valor intrínseco, ou seja, construir uma ontologia materialista, uma framework dentro da qual se derivaria e demonstraria o valor das coisas. Isso forçaria todo o corpo da economia pós-marginalista que se apóia no valor-utilidade a aguçar a defesa desse princípio fundamental para além das objeções epistemológicas à possibilidade pragmática de um planejamento econômico (que em si implica em uma ontologia implícita, ou ao menos uma hierarquia dos valores).
Claro, é preciso que esta ontologia fuja das armadilhas típicas encontradas pelas teorias de organização industrial das economias planificadas. É preciso que seja dinâmica, endogeneizando a mudança constante de motivações por trás do que os homens entendem como realização para suas vidas. É preciso também que seja auto-sustentável por um sistema de regras estável, razão pela qual a teoria dos jogos precisa estar presente nela o tempo inteiro. Não podemos, simplesmente, confiar na ação positiva de uma burocracia.
Ei, você, leitor aleatório do Anacoluto. Se você resolver levar esta idéia à frente, eu quero crédito. Aliás, faça-me participar do seu projeto. Eu estou disposto a trabalhar com um marxista, mas não com essas massas educadas numa vulgata anti-mercados de vagas considerações humanistas. Se você entende do que eu estou falando, já é um bom começo. Eu tenho Orkut, procure-me.